...por anos era assim que eu acordava: 04 da manhã, lá estava "ieu" vivendo na minha velha e boa Ponta Negra (Natal/RN)!!

terça-feira, 6 de outubro de 2015

Barba McCoy

Barba McCoy e Outras Histórias




Barba McCoy nasceu de um delírio, numa época em que eu amava a vida de maneira como não se deve amar – pelo menos não tanto assim. Mesmo no segundo casamento e já com três filhos pequenos, a ânsia de beber – e principalmente comer o mundo – ainda tomava conta de mim, tal qual na adolescência.
Minhas prioridades então não eram nada condizentes com as de um pai-de-família tradicional. Surfar, beber “y otras cositas más” eram sempre minhas primeiras escolhas. Uma bussola “sui generis” que, além de afastar-me do caminho para a obtenção do titulo de “Bem Sucedido” também resultou em destituir-me do trono familiar.



Naquela época, embora encontrasse alegria em diversos lugares, a experiência de ter filhos era a que mais me agradava. Sem apologias ou sentimentalismos, quanto a eles, a palavra AMOR é insuficiente para adjetivar o que sentia (e sinto) por eles, desde quando chegaram por estas bandas. Mesmo sem ter os padrões cronológicos bem definidos, guardo a emoção de cada momento que passamos juntos: risos, cheiros (e fedores), conversas, lutas, “artes”, broncas, cumplicidade, amizade...


Um dos momentos que eu mais gostava era quando eles me pediam para que lhes contasse histórias, geralmente na hora de dormir. Quase sempre deitados, olhos fixos em mim, esperavam o “Era uma vez...”.
Não, não eram histórias pré-fabricadas, daquelas que todos contam a seus filhos. Eu as inventava naquele exato momento em que a expectativa deles exigia de mim uma narrativa apropriada. Então um objeto qualquer no quarto ou a lembrança de algo corriqueiro (muitas vezes ambos) se juntava ao que eu recordava de um filme ou música. E na forma de um delírio, começava mais uma “epopeia”, daquelas que nem eu tinha ideia de como seria. A ação ia-se descortinando no exato momento da narração. E ganhava forma, encorpando-se à medida que os olhares dos meus espectadores-mirins, esbugalhados, expressavam, mais que curiosidade, interesse real. Olhos atentos, movimentos nervosamente involuntários e risos impacientes eram o combustível ideal para a criação espontânea. E tudo o que pairava a nosso redor ia se encaixando – ideias, palavras, personagens...



Muitas dessas histórias tinham vida curta – duravam apenas aquela noite. Outras foram tão marcantes que, invariavelmente, suas continuações eram exigidas. Nesses casos, personagens eram mantidos e o que mudava era o desenrolar dos acontecimentos. Como as histórias da “Bola Azul”, onde os meninos eram tragados por uma bola (azul, claro) que aparecia em um determinado lugar e os transportava para outra dimensão, onde, num mundo azul (...) várias aventuras aconteciam. Tinha também a do “Multi Homem”, um cara muito atrapalhado que fora atingido por um minúsculo pedaço de um planeta mágico, bem no momento em que estava na sala-dos-espelhos de um parque - sozinho, com milhares de imagens suas refletindo-se ao seu redor. Tal acidente então lhe deu “poderes”, fazendo com que ele se transformasse involuntariamente em tudo o que pensasse ou falasse. Poder este que lhe causava mais efeitos colaterais que benefícios...
E teve a do Barba McCoy, que surgiu de um jeito diferente. O que era somente para preencher a lacuna de um momento sem inspiração acabou sendo uma história com muitas continuações (capítulos, eu diria). Tamanha era minha paixão por contar a saga do Barba (e a dos meninos em ouvi-las) que, uma vez, minha “ex-posa” (na época esposa) pediu-me para alugar um filme do Barba McCoy. Eu não acreditei! E quando disse a ela que o Barba era apenas o delírio criativo da minha mente doentia, que eu tinha inventado todas aquelas histórias, vi as expressões do seu olhar alternando-se por três fases quase ao mesmo tempo: incredulidade, tristeza e gargalhadas, nessa mesmíssima ordem! Tão real que era a saga do Herói...




Sim, por ora falarei a vocês sobre Barba McCoy. Primeiro, para entender você tem que procurar uma musica chamada Papa Barkoye, da excelente banda de reggae Alpha Blondy (pode ser em https://youtu.be/m4XWtLF1k4Y). Aí, escute essa musica umas 4 ou 5 vezes, de preferência sem tentar entender o que ele está dizendo (isso vai ser fácil) – apenas sentindo a melodia. Então, com a minha “versão” em mãos, escute a música outra vez, devagar, tentando encaixar a minha “versão” ao que escutar. Leia cada frase somente quando ele estiver cantando aquele trecho... Como se fosse exatamente a letra da música. Leia devagar... Aí é só dar asas aos pensamentos...
Um último parêntesis: desde pequeno eu era fã do Rock’n roll e suas vertentes. Principalmente musicas em inglês. Não, nunca fui um poliglota, embora tenha fluência no espanhol. Meu inglês limita-se a saber que o livro sim está sobre a mesa! O que me fazia (e ainda me faz) gostar de músicas num idioma desconhecido é justamente a minha ignorância, pois esta não me deixa aprisionado às ideias contidas nas suas letras. Meu fascínio tem mais a ver com criação do que com o sentido em si. Explico-me: cato as palavras que entendo, misturo-as com a melodia e pronto – cria-se o significado da canção para mim! E, pasmem, passo anos gostando daquela música que me diz exatamente o que quero! Assim tem sido! Assim continuará sendo!  Assim nasceu Barba McCoy... Coloque o som e “enjoy it, Joey...”

Clique AQUI e acompanhe a leitura ao som da música



Barba McCcoy

Barba McCoy, sou Barba McCoy,
sou eu, surgindo da lama;
Sou Barba McCoy, Barba McCoy,
olha, eu não sou do mal;
Barba McCoy, sou Barba McCoy,
voltei, lutei, sei atirar;
Sou Barba McCoy, Barba McCoy,
olha, eu vim me vingar...

De casa saiu, beijou a mulher, foi viajar,
sua casa então queimaram com a mulher que adorava;
Gente da lei matou sua mulher e filhos – vou vingar,
e ele entrou na noite escura da cidade, pra matar;
E vencerá, e à pé foi lá, até achar, e com o pé chutar;
o pé foi lá, o pé foi cá, e com os pés matar;
E os capou, depois matou, aqui, bandidos, ali, quinze, vinte:
“Enterrei na bosta...!!!’;
“Vou cavar, vou cavar, vou-ou-ou-ou: Farei um cemitério!!”

Eles mataram pra me roubar,
Prefeito, Xerife, vou me vingar;
E no Saloon entrou a atirar,
e o prefeito conseguiu matar;
Não vale à pena implorar,
pois nem a lei eu vou perdoar;
E então depois ele foi chamar,
Xerife e Polícia pra duelar;

Barba McCoy, sou Barba McCoy,
em pé, não durmo na cama;
Sou Barba McCoy, Barba McCoy,
as armas sei usar;
Barba McCoy, sou Barba McCoy,
mijei, deixei a barba;
Sou Barba McCoy, Barba McCoy,
olha só meu bigodão...

E na tarde quente de escaldar,
na rua deserta um tufo a voar;
Seis capangas e o Xerife lá,
e o Barba começou a atirar;
Os tiros começaram a soar,
e sete corpos a despencar;
McCoy coçou o bigode e a barba,
e partiu então soprando sua arma...

Então depois de se vingar,
fugiu sozinho a cavalgar;
e pelo Oeste foi viajar,
“Sou procurado, vão me matar...”;
E vou apenas te falar:
Não vá de medo se cagar;
Se um dia precisar se vingar,
é só meu nome então chamar...



Claro que a história inicial do Barba McCoy não era EXATAMENTE a que você acabou de ler, pois a original foi um rompante de um belo momento que ficou para trás. E como geralmente essas histórias eram contadas com a música original ao fundo, então inúmeras versões se sobrepunham a cada “recontagem” dela. Mas a ideia inicial dela e meu “Poder Demente” ainda estão aqui. E, impregnado de amor e saudade dos meus filhos, aceito de muito bom grado relembrar este momento e por fim escrever a saga do Barba Mccoy...