...por anos era assim que eu acordava: 04 da manhã, lá estava "ieu" vivendo na minha velha e boa Ponta Negra (Natal/RN)!!

terça-feira, 4 de junho de 2019

Da Grécia


04/06/19


O tempo passa muito rápido, infelizmente. Ainda mais após uma grande viagem onde se passou meses planejando todos seus detalhes. Por mais que se viva intensamente cada momento viajando, a hora de voltar acaba chegando. E cá estou eu, de volta à casa, com aquele ranço característico dos que retornam do paraíso, após dias tão inesquecivelmente gregos.
Num barco por Zakinthos...

         Não, este não é um roteiro de viagem contendo dicas precisas sobre onde ir, o que comer ou fazer. Muito menos um diário de viagem com informações registradas cronologicamente dos acontecidos e seus pormenores. Talvez tenha até um pouco de cada... De forma despretensiosa, resolvi escrever apenas observações sobre o que vi, vivi e principalmente senti, do pouco que conheci da Grécia. E como após alguns poucos dias de regresso, começo a embaralhar nomes e datas dos lugares visitados, melhor começar a redigir logo, antes que o “embaralhamento” cerebral domine minhas lembranças...

De 17 a 29 de maio saímos de Curitiba e cruzamos estados, países, Atlântico sul e norte, entre sofríveis voos, aeroportos e alfandegas. Nos aviões da Allitalia, somavam-se a boa comida aos bons vinhos, mas subtraía-se conforto e atendimento – tripulação italiana carregando sua típica grosseria no trato com os passageiros. Nos aeroportos, a pressa, os controles de imigração, os raios-x e a falta de informações eram sempre presentes. Mas para mim, em nenhum momento, nada disso ofuscou a alegria da certeza da glória final: Grécia!!

Foram 2 dias em Atenas, 3 em Santorini, 3 em Mykonos e 3 em Zakynthos (nessa ordem), para depois regressarmos a Atenas no dia da partida. Entre casas alugadas, hotéis, mais aviões (grandes e pequenos), Ferrys e carros alugados, sobrevivemos – e muito bem! Saímos em 3 pessoas do Brasil para, em Atenas, encontrarmos com mais 5 vindo dos EUA (2 da Califórnia e 3 de Connecticut), todos num grau que oscila entre parentes e muito bons amigos.

... nada como congelar nas águas do mar Jônico... Zakynthos

Em Atenas, apartamentos alugados perto da Acrópole. Isso nos poupou de dirigirmos - caminhar por ali foi fácil com o Google. Parte do centro de Atenas lembra a caótica simetria porto-alegrense, seus prédios e ruas esquisitamente dispostas. Compramos nossos tickets para visitarmos Acrópole, Partenon & Cia, e no caminho fui o único a conseguir evitar que os gigantescos africanos e alegres que fazem ponto nas redondezas me “presenteassem” com suas pulseirinhas coloridas abençoadas em troca de alguns Euros. 
quando Atenas lembra Porto Alegre...

Vimos muita história, pisamos em milhares de pedras, driblamos inúmeros turistas (isso que fomos cedo, perto das 8 da manhã). Entre um local e outro a ser visitado, comi Gyrus (se diz Hyrus) de porco, bebi algumas cervejas e logo fiquei fã da Alfa (a Strong, 7% alc. vol. ). 

Alfa... a Bira!!!!

Na saída de uma dessas visitas históricas demos de cara com uma feira ao ar livre. Diversas curiosidades, artesanatos e antiguidades à venda. Diversas pessoas, diversas flores e cheiros numa profusão de vida a todo instante. Muitas caminhadas, sempre grato pelos tênis confortáveis.
pelas ruas de Atenas...

Como toda grande cidade turística, Atenas é uma Babel. Caoticamente entupida de gente de todas as partes do mundo. Prestando atenção ao redor, a mistura das mais variadas e estranhas línguas ecoa ao redor como música inteligível. Gostava de, às vezes, tentar prestar atenção aos diferentes sotaques e palavras que não entendia. Belas lojinhas, ruas cinematográficas, mais comida, mais cerveja, e a preciosa dica do amigo Aldo – ir ao bairro de Plaka, um ligar muito bonito, perto da Acrópole, com partes que lembram as charmosas ruas da minha amada Pipa/RN, só que grega. Lindas ruas, lojas e restaurantes, cafés.


Santorini. Ficamos em um hotel excelente – Aplai Dome. Excelente café da manhã, quartos bem confortáveis, visual lindo,  atendimento impecável, funcionários do hotel, além de prestativos, verdadeiramente simpáticos. Localização estratégica, bem perto da famosa Oia (se diz ia).
Em Santorini há dois lugares que precisam ser visitados: Oia e Thira (se diz Fira). Esta última é a capital da ilha, tem um belíssimo visual, do alto, onde você vê o mar com alguns navios de cruzeiro zanzando.


Aqui há bastante lojinhas e ótimos restaurantes, tudo em ruelas dispostas em forma de labirintos. Para chegar à Thira há um trânsito caótico e um estacionamento público (gratuito) que dá medo deixar o carro parado, pois cada um estaciona onde e como bem entende. Nada demais, basta ter paciência.
Santorini e seu cartão postal...

Particularmente preferi Oia. Ali as ruas também são estreitas, mas não são claustrofóbicas – tudo do alto da montanha pedregosa e a céu aberto. É aqui que você vai fotografar a famosa igrejinha branca de teto azul arredondado com o mar ao fundo, adornada por casinhas brancas cuja arquitetura lembra os Flintstones. Esse lugar é tão fotogênico que aposto que clicar em qualquer direção produzirá fotos fantásticas.

E os pontos para as fotos mais clássicas estão devidamente demarcados por turistas (geralmente asiáticos) com suas máquinas fotográficas e celulares em punho, quase sempre em poses clássicas. Pelas pitorescas ruas de Oia eu era um contraste com as centenas de pessoas  desfilando suas roupas gregas esvoaçantes e alguns chapéus voadores – venta muito nas ilhas gregas...
Mais uma cerveja "honesta" grega...

Fizemos também um passeio de barco. Barco só nosso, com direito a almoço preparado na hora, vinhos, águas, refrigerantes e, claro, cervejas! Vimos muitas praias e baías lindas, águas num tom de azul escuro indescritíveis, emoldurando ilhotas rochosas. Passamos perto de um vulcão. Ouvimos histórias contadas pelos 3 tripulantes do barco sobre algumas ilhas e vilas dali, umas sem qualquer infraestrutura, outras com 2 ou 3 casas apenas. 
Frio no mar Egeu... valeu à pena!!!
Pulei no mar. Quase congelei, mas pulei mesmo assim. Nadei, mergulhei, boiei no mar Egeu. Recomendo uma roupa de borracha, mas eu, troglodita como sou, mesmo a despeito das muitas recomendações, entrei só de shorts mesmo. Frio, o dia nublado ventava muito, mas as cervejas e os vinhos, aliados à toalha, foram fundamentais para a minha sobrevivência.
almoço no barco... e eu destoando das roupas gregas...

Seja educado e vá além do inglês. Guarde algumas palavras em grego. Embora todos consigam te atender em inglês, vale à pena saber algumas palavras no idioma deles. Vou escrever a seguir algumas exatamente como se pronunciam e seus significados a seguir: IASSAS (Olá/Oi); KALIMERA (Bom dia); KALISPERA (Boa tarde/Boa noite); KALINISHTA (ao se despedir de alguém, à noite); EFKARISTÔ (Obrigado), e quando você agradece em grego, receberá um dos mais sinceros sorrisos que já viu, acompanhado de um PARAKALÔ ( De nada). Nessa hora, alguns ficam tão emocionados que podem até querer saber como se agradece em português.

Simpatia genuína mesmo. E não esqueça que BIRA é cerveja. Falando nisso, prove o Ouzo (se diz UZO), que é o Arak ou Aniz. Com gelo é muito bom. E como falei em cerveja, em Santorini elegi a melhor Bira que tomei na Grécia: Red Donkey. Tem de várias cores, mas a Red é a mais forte. Vale o preço!
cerveja artesanal de Santorini... pra mim, a melhor...

Mykonos – fomos num Ferry gigantesco, cheio de gente e restaurante à bordo. Saindo de Santorini, Mykonos é a segunda parada. Umas duas horas mais ou menos navegando. Tivemos sorte do mar estar calmo, pois há relatos de balanços, vômitos e enjoos assustadores. Se você levar muitas malas consigo, faça como nós, tenha uma daquelas correntes/cadeados de bicicleta para prendê-las juntas, pois elas vão em num compartimento separado – melhor prevenir.
Little Venice, moinhos de vento, pôr-do-sol

Mykonos também é linda, uma cidade “gregamente” planejada. Little Venice, os moinhos de vento, lugar para um pôr-do-sol inesquecível. Para se chegar às famosas e típicas ruazinhas estreitas, paramos o carro num estacionamento em uma rua acima (pago) e haja pernas. 
visual do pôr-do-sol dos moinhos de vento

Descida. As ruazinhas são mais fechadas que as de Santorini. São lindas. São labirintos pré-fabricados, pinturas brancas ao redor das pedras – pura estética mesmo. Por entre as lojinhas brotam restaurantes, cafés, “bakerys” que faziam a gente parar e comer. E come-se bem por lá. Tanto em qualidade como em quantidade.
Do momento em que chegamos no porto até nossa casa, percorremos de caro ruas muito estreitas, circundadas por muretas de pedra, tendo ao fundo uma natureza típica de clima seco, embora com muitas plantas e principalmente pedras. Muitas pedras. Beleza totalmente diferente das que eu conhecia. Nas estradas, cuidado. Quando vinha algum veículo na direção contrária, apreensão total. Até hoje não sei como conseguíamos passar. Mistérios gregos...

Xigia, Zakynthos

As praias dessa ilha dividem-se em super badaladas, desertas ou algumas intermediárias. Em algumas como Paradise e Super Paradise beach, prepare-se para deixar as calças – além de cobrarem uma fortuna por uma espreguiçadeira, sim, você pode ficar pelado tranquilamente.

Não, não o fizemos! As praias que visitamos não tinham areia, então não parecia ser uma boa ideia esticarmos as toalhas e deitarmos nas pedras. Escolhemos Platys Gialos e lá nos aboletamos em espreguiçadeiras com guarda-sóis para passarmos boa parte do dia. Sol, água linda (e gelada), petiscos, drinks e cerveja gelada (na verdade, chopp Alfa, muito bom). E um garçom contador de histórias que falava razoavelmente bem o português.


Zakynthos. Partindo da Mykonos tivemos que voltar à Atenas para, num “mini-avião”, voarmos até nosso destino. Mar Jônico. Mais ou menos uma hora de viagem. Esta é a maior ilha das que visitamos. E por sua localização, o clima do norte europeu se faz presente, alterando por sua vez a paisagem. Aqui o verde se faz muito mais presente – mais verde do que pedras. Mais natureza. Mais arquitetura real, diferente das arredondadas e branquinhas construções das ilhas anteriores. Muitas casas feitas de pedra, incluindo-se a que ficamos, numa praia chamada Xigia (pronuncia-se Qsiguia). Xigia beach houses.
..."A" casa, Xigia beach House

... a casa, por dentro...

A ilha é menos turística que as anteriores: mais pessoas e famílias, menos profissionais de turismo; mais sorrisos sinceros e abraços; centrinho mais real, casas mais reais, pessoas mais atenciosas... Adivinhem qual das ilhas eu mais gostei...


Estradas serpenteando o mato verde, quase sempre crivado de oliveiras. Alguns carros velhos parados, pessoas idem, cabras, bodes, pássaros e muitos, muitos gatos por toda a ilha. Museu da Azeitona (Fábrica de Azeites de Oliva), com degustação de azeites & azeitonas, além de venda. Restaurantes diversos no centrinho, alguns turísticos, alguns tradicionais. Numa praia, em Agios Nikolaos, restaurante Nobelos – lugar para se sentir bem, comer bem, ser estupidamente bem atendido e se possível passar o dia, pois eles tem estrutura de restaurante e de praia. Até hotel eles tem. Fantástico!


A famosa Navagio Beach foi devidamente vista de cima (com fotos registradas) e depois visitada da única forma possível: de barco. Mais uma vez, barco só nosso, com cerveja e demais líquidos inclusos, além de lanche e salada de frutas. Visitamos também as famosas blue caves também. Também entrei no mar diversas vezes. Também congelei, nadei, boiei, pensei, relaxei... Também valeu muito à pena!
Navagio visto de cima...

Nadei sozinho da lancha até Navagio Beach. Andei pisando nas pedras ao redor do grande navio enferrujado naufragado. Imenso monstro marrom esquartejado. Na volta, trouxe no bolso do short duas pedrinhas para minha mãe. Agora essas pedras irão morar no Brasil...


Então pelas muitas estradas, num dia chuvoso em Zakynthos , enquanto a paisagem desfilava diante de mim, eu absorvi a Grécia. O ar, o clima, as pedras, as oliveiras, as casas, os moinhos, tudo isso eu absorvi. Trouxe a Grécia para dentro do meu ser. Tanto que posso sentí-la agora, no exato momento em que fecho os olhos. Tão real quanto o gosto do café grego – forte, estilo café árabe, preparado por decantação...

eu, ateu, acendendo vela na igreja grega

Numa das tardes, nas águas geladas e lindas de Xigia, no meio daquele azul-claro de origem provavelmente calcaria, consegui boiar (bendita salinidade grega). Os barulhos externos deram lugar ao silêncio, quebrado aqui e ali pelos ruídos das pedras acomodando-se no fundo do mar ao sabor do movimento da maré. Lá estava eu, envolto pelo mar Jônico, gelado, relaxando, olhando para o céu, as escarpas pedregosas ao meu redor, as pouquíssimas e apressadas nuvens no céu.

Podia sentir a viscosidade da água entre cada um dos meus dedos das mãos, como se fosse sólida. Meus pensamentos se foram por completo naquele momento. Eu não pensava em nada, eu nada era, eu só sentia. Só respirava. Só estava lá. Eu não só absorvia a Grécia – eu era tudo aquilo. Fácil flutuar ali; fácil esquecer de tudo o que não fosse aquele azul daquele mundo. Fácil se perder em si mesmo, de si mesmo. Fácil concluir que, mesmo que a Grécia nunca tenha sido meu destino dos sonhos, a partir daquele momento ela será uma de minhas melhores lembranças, nos meus melhores sonhos.


Obrigado Grécia. Hoje eu vivo um pouco aí, do mesmo jeito que vives um pouco em mim.


... simples assim...


segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Eu Choro



Choro por Paris e as tantas mortes;
pela jovem que dançava freneticamente:
rock, outro cigarro, outra dose,
o êxtase sublime de estar viva!
Dança despreocupada celebrando a alegria,
alheia à proximidade de seu algoz,
espírito livre - susto, gritos, correria,
tudo tão rápido, tão desconexo...

Choro pelo que morreu e matou, suicida,
um dia criança esculpida pelo ódio,
carregada de dores ideológicas em si:
matar e morrer, o único caminho!
Vingar seus pais, seu país, seus ideais,
libertar seu povo, seu deus, sua dor;
na decisão, amarrar a morte em seu corpo,
alma liberta voando em pedaços...

Choro pelo rebanho de imigrantes vagando,
fuga confusa numa marcha sem rumo,
trocando tradições por um mundo "civilizado",
tornando-se ilegais, mendigos, rejeitados!
Sujam as ruas causando revolta,
semeiam o medo por todo o ocidente,
xenofobia disfarçada em temor:
"Se vão ficar aqui, não saiam de seus guetos!!!"...

Choro pela negra suja e maltrapilha
na aldeia de zumbis perambulando desconexa,
esguia, esquelética, em busca de comida
e da tal dignidade, há muito roubada!
O câncer do ocidente - detrito colonizado,
país redesenhado, tão pilhado e saqueado:
África, um dia berço da civilização,
hoje cemitério - aqui jaz a raça humana...

Choro pelo chinês escravo num navio
produzindo sonhos ocidentais em troca dos seus,
família, lembranças, brincadeiras de criança,
tudo para trás em nome da sobrevivência!
O belo "Nike" importado - sonho de consumo
comprado à prazo - sonho à vista,
ao lado do corpo de um jovem sonhador:
era um lindo tênis vermelho - da cor do seu sangue...

Choro pelo menor descalço na rua,
excluído da nossa redoma confortável:
McDonald's, Papai Noel, Smartphone,
uma criança querendo apenas ser igual!
Frustração que dói bem mais que a fome,
cujo remédio alucina, alivia a dor pelos pulmões:
e fuma, e pede arma, e pede raiva,
e mata para ter seus pés calçados...

Choro pelos sonhos de um homem,
comerciante, já tão roubado pelo Sistema,
bom mineiro, guardou dinheiro no colchão,
e veio a lama e levou-lhe, lavou-lhe os sonhos!
Barro tóxico a criar suas sepulturas,
enterrando vidas, arrastando cadáveres,
sepultando a cidade e suas lembranças:
dinheiro sujo sufocando rios e mares...

Choro, enfim, por quem você vê
e também por quem não conhece;
choro pelas tragédias noticiadas,
e pelas que não saem nos jornais;
choro pelo amanhecer no calçadão,
mendigos acordando com o cheiro do café;
choro pelo olhar do vendedor de cigarros paraguaios,
preocupado com a chegada dos fiscais...

Choro por você que como eu, vive aqui,
nesse mundo desumano e desigual;
instintos à solta - matar e morrer,
destruição de almas, de sonhos, de vidas;
choro por mim, que vejo isso acontecendo
e fico aqui sentado, fumando e escrevendo,
relatando tragédias e tomando outro café
enquanto meus irmãos choram suas dores...

terça-feira, 6 de outubro de 2015

Barba McCoy

Barba McCoy e Outras Histórias




Barba McCoy nasceu de um delírio, numa época em que eu amava a vida de maneira como não se deve amar – pelo menos não tanto assim. Mesmo no segundo casamento e já com três filhos pequenos, a ânsia de beber – e principalmente comer o mundo – ainda tomava conta de mim, tal qual na adolescência.
Minhas prioridades então não eram nada condizentes com as de um pai-de-família tradicional. Surfar, beber “y otras cositas más” eram sempre minhas primeiras escolhas. Uma bussola “sui generis” que, além de afastar-me do caminho para a obtenção do titulo de “Bem Sucedido” também resultou em destituir-me do trono familiar.



Naquela época, embora encontrasse alegria em diversos lugares, a experiência de ter filhos era a que mais me agradava. Sem apologias ou sentimentalismos, quanto a eles, a palavra AMOR é insuficiente para adjetivar o que sentia (e sinto) por eles, desde quando chegaram por estas bandas. Mesmo sem ter os padrões cronológicos bem definidos, guardo a emoção de cada momento que passamos juntos: risos, cheiros (e fedores), conversas, lutas, “artes”, broncas, cumplicidade, amizade...


Um dos momentos que eu mais gostava era quando eles me pediam para que lhes contasse histórias, geralmente na hora de dormir. Quase sempre deitados, olhos fixos em mim, esperavam o “Era uma vez...”.
Não, não eram histórias pré-fabricadas, daquelas que todos contam a seus filhos. Eu as inventava naquele exato momento em que a expectativa deles exigia de mim uma narrativa apropriada. Então um objeto qualquer no quarto ou a lembrança de algo corriqueiro (muitas vezes ambos) se juntava ao que eu recordava de um filme ou música. E na forma de um delírio, começava mais uma “epopeia”, daquelas que nem eu tinha ideia de como seria. A ação ia-se descortinando no exato momento da narração. E ganhava forma, encorpando-se à medida que os olhares dos meus espectadores-mirins, esbugalhados, expressavam, mais que curiosidade, interesse real. Olhos atentos, movimentos nervosamente involuntários e risos impacientes eram o combustível ideal para a criação espontânea. E tudo o que pairava a nosso redor ia se encaixando – ideias, palavras, personagens...



Muitas dessas histórias tinham vida curta – duravam apenas aquela noite. Outras foram tão marcantes que, invariavelmente, suas continuações eram exigidas. Nesses casos, personagens eram mantidos e o que mudava era o desenrolar dos acontecimentos. Como as histórias da “Bola Azul”, onde os meninos eram tragados por uma bola (azul, claro) que aparecia em um determinado lugar e os transportava para outra dimensão, onde, num mundo azul (...) várias aventuras aconteciam. Tinha também a do “Multi Homem”, um cara muito atrapalhado que fora atingido por um minúsculo pedaço de um planeta mágico, bem no momento em que estava na sala-dos-espelhos de um parque - sozinho, com milhares de imagens suas refletindo-se ao seu redor. Tal acidente então lhe deu “poderes”, fazendo com que ele se transformasse involuntariamente em tudo o que pensasse ou falasse. Poder este que lhe causava mais efeitos colaterais que benefícios...
E teve a do Barba McCoy, que surgiu de um jeito diferente. O que era somente para preencher a lacuna de um momento sem inspiração acabou sendo uma história com muitas continuações (capítulos, eu diria). Tamanha era minha paixão por contar a saga do Barba (e a dos meninos em ouvi-las) que, uma vez, minha “ex-posa” (na época esposa) pediu-me para alugar um filme do Barba McCoy. Eu não acreditei! E quando disse a ela que o Barba era apenas o delírio criativo da minha mente doentia, que eu tinha inventado todas aquelas histórias, vi as expressões do seu olhar alternando-se por três fases quase ao mesmo tempo: incredulidade, tristeza e gargalhadas, nessa mesmíssima ordem! Tão real que era a saga do Herói...




Sim, por ora falarei a vocês sobre Barba McCoy. Primeiro, para entender você tem que procurar uma musica chamada Papa Barkoye, da excelente banda de reggae Alpha Blondy (pode ser em https://youtu.be/m4XWtLF1k4Y). Aí, escute essa musica umas 4 ou 5 vezes, de preferência sem tentar entender o que ele está dizendo (isso vai ser fácil) – apenas sentindo a melodia. Então, com a minha “versão” em mãos, escute a música outra vez, devagar, tentando encaixar a minha “versão” ao que escutar. Leia cada frase somente quando ele estiver cantando aquele trecho... Como se fosse exatamente a letra da música. Leia devagar... Aí é só dar asas aos pensamentos...
Um último parêntesis: desde pequeno eu era fã do Rock’n roll e suas vertentes. Principalmente musicas em inglês. Não, nunca fui um poliglota, embora tenha fluência no espanhol. Meu inglês limita-se a saber que o livro sim está sobre a mesa! O que me fazia (e ainda me faz) gostar de músicas num idioma desconhecido é justamente a minha ignorância, pois esta não me deixa aprisionado às ideias contidas nas suas letras. Meu fascínio tem mais a ver com criação do que com o sentido em si. Explico-me: cato as palavras que entendo, misturo-as com a melodia e pronto – cria-se o significado da canção para mim! E, pasmem, passo anos gostando daquela música que me diz exatamente o que quero! Assim tem sido! Assim continuará sendo!  Assim nasceu Barba McCoy... Coloque o som e “enjoy it, Joey...”

Clique AQUI e acompanhe a leitura ao som da música



Barba McCcoy

Barba McCoy, sou Barba McCoy,
sou eu, surgindo da lama;
Sou Barba McCoy, Barba McCoy,
olha, eu não sou do mal;
Barba McCoy, sou Barba McCoy,
voltei, lutei, sei atirar;
Sou Barba McCoy, Barba McCoy,
olha, eu vim me vingar...

De casa saiu, beijou a mulher, foi viajar,
sua casa então queimaram com a mulher que adorava;
Gente da lei matou sua mulher e filhos – vou vingar,
e ele entrou na noite escura da cidade, pra matar;
E vencerá, e à pé foi lá, até achar, e com o pé chutar;
o pé foi lá, o pé foi cá, e com os pés matar;
E os capou, depois matou, aqui, bandidos, ali, quinze, vinte:
“Enterrei na bosta...!!!’;
“Vou cavar, vou cavar, vou-ou-ou-ou: Farei um cemitério!!”

Eles mataram pra me roubar,
Prefeito, Xerife, vou me vingar;
E no Saloon entrou a atirar,
e o prefeito conseguiu matar;
Não vale à pena implorar,
pois nem a lei eu vou perdoar;
E então depois ele foi chamar,
Xerife e Polícia pra duelar;

Barba McCoy, sou Barba McCoy,
em pé, não durmo na cama;
Sou Barba McCoy, Barba McCoy,
as armas sei usar;
Barba McCoy, sou Barba McCoy,
mijei, deixei a barba;
Sou Barba McCoy, Barba McCoy,
olha só meu bigodão...

E na tarde quente de escaldar,
na rua deserta um tufo a voar;
Seis capangas e o Xerife lá,
e o Barba começou a atirar;
Os tiros começaram a soar,
e sete corpos a despencar;
McCoy coçou o bigode e a barba,
e partiu então soprando sua arma...

Então depois de se vingar,
fugiu sozinho a cavalgar;
e pelo Oeste foi viajar,
“Sou procurado, vão me matar...”;
E vou apenas te falar:
Não vá de medo se cagar;
Se um dia precisar se vingar,
é só meu nome então chamar...



Claro que a história inicial do Barba McCoy não era EXATAMENTE a que você acabou de ler, pois a original foi um rompante de um belo momento que ficou para trás. E como geralmente essas histórias eram contadas com a música original ao fundo, então inúmeras versões se sobrepunham a cada “recontagem” dela. Mas a ideia inicial dela e meu “Poder Demente” ainda estão aqui. E, impregnado de amor e saudade dos meus filhos, aceito de muito bom grado relembrar este momento e por fim escrever a saga do Barba Mccoy...





terça-feira, 18 de agosto de 2015

Sobre Fernando de Noronha e Porto de Galinhas

CONHECENDO E VIVENDO NORONHA & PORTO DE GALINHAS

BAD AS IGUANA BE...


Eu tenho areia debaixo das unhas nos dedões dos pés. Fica preto assim, nos cantos. Dá pra ver, pois ainda estou de chinelos. Areia escura, de origem vulcânica, vinda de Fernando de Noronha. Não é sujeira – é um pedaço do paraíso que carrego comigo, junto de tantas lembranças...
Recife, orla de Boa Viagem. Park Hotel. Bonito e bem funcional (ótima dica dada pelo meu amigo Aldo Garcez). O lugar, bem, urbano demais. Gente demais. Carros demais, principalmente quando se chega de Noronha. A ILHA!!! Eu gostaria de morar lá. Já em Recife, moraria, ainda que a contragosto. Nada contra a cidade ou seu povo, só contra o “muita gente”. Em Curitiba, onde moro, a falta do mar sufoca minhas guelras: muita gente, nenhuma praia – péssima combinação! Preciso do mar para viver. Simples assim...
foto clássica: da praia do Sancho, morro Dois Irmãos ao fundo.
Em Noronha, quatro dias numa pousada domiciliar – Pousada da Gaúcha. Simples – simplesmente perfeita! Antes de embarcarmos pra Ilha ficamos oito dias num “big” hotel - Village Porto de Galinhas. Lugar lindo e completo, com um inesquecível café da manhã, conforto e inúmeras piscinas. Na praia do Cupe onde surfei ótimas ondas praticamente sozinho. Mesmo num Hotel grande e nada rústico, os caras mandaram bem na sua estruturação: para mim é um Hotel na categoria dos Resorts... Mas foi na Ilha de Noronha onde me senti melhor. Natureza exuberante com simplicidade. Longe do mundo artificial que nos cerca diariamente. Não adianta, sou bicho-do-mato mesmo... Digo, bicho-do-mar...
...sim, sou um bicho-do-mar...

Sendo um pouco cronológico, vamos à Porto de Galinhas:
1.      Do hotel em Porto de Galinhas: Não há o que reclamar. Tivemos um problema no primeiro dia com o colchão (feito de pedra). Ao reclamarmos, trocaram por um colchão que, além de duro estava molhado. Isso mesmo! Reclamamos, e como não dava pra resolverem naquele momento (era noite já), retornaram o colchão “ortopedrico” por aquela noite, prometendo resolver no dia seguinte. Resolveram, mas um novo colchão ainda meio empedrado... tudo bem!!!! 
uma das piscinas do Village Porto de Galinhas: muuuito bom!!!!

     Compensado pelo excelente café da manhã, espaços bacanas e confortáveis no hotel, shows de música noturnos (o cantor italiano Francesco conseguiu me fazer cantar e até dançar)... e o mensageiro, João, gente finíssima, ótimo funcionário e pessoa;
engorda-se muito no café da manhã - hotel Village Porto de Galinhas

2.      Das comidas em Porto de Galinhas: Centrinho bacana, muitos bares e restaurantes nada baratos, começo de agosto sem tanta gente perambulando por lá (dizem que na temporada fica lotado, tipo centro de Sampa); destaques: restaurante Domingos (pelo nome já vale); Gula da Praia (https://www.facebook.com/pages/Gula-da-Praia/858600180829380), lugarzinho modesto mas com bolos excelentes);  Creperia La Creperie (http://www.lacreperie-pe.com.br/), pra mim o melhor de lá; Òtimas tapiocas na Tapioca da Praia (https://pt-br.facebook.com/pages/Tapioca-Da-Praia/336202679793830); Casa da Francesinha, num mini shopping, onde você TEM que comer um sanduíche chamado “Francesinha”; Barcaxeira, famoso, mas só vá se você REALMENTE gosta de alho (os caras parecem temer vampiros). Tem ainda o La Tratoria, onde o jantar, pra mim, ficará sempre na memória (pena que já saiu do estômago).
La Tratoria: numa ruazinha transversal: procure que vale à pena!!!

         E pelas ruas do centro é só andar que você encontrará outros lugares pra todos os bolsos, dos chiques aos PFs...
no passeio à praia dos Carneiros você toma banho de argila... e cresce o nariz!!!

3.      Dos Passeios em Porto de Galinhas: Bom, conhecer o lugar é preciso rodar... Das agências por lá, seguimos umas dicas e contratamos a PIMENTEL. Os caras são bons e até certo ponto seus preços são justos. O passeio ponta-a-ponta é bacana, pois num dia o Buggy te leva pra conhecer as principais praias e termina no rio Maracaípe, onde você passeia de jangada e vê um cavalo marinho envelhecido num vidro (o jangadeiro jura que acabou de pegar). Depois tem o passeio “city tour” a Recife e Olinda (muito bom);  Passeio à praia dos Carneiros, onde o intuito é te deixar num restaurante, ao final, consumindo... Os passeios em si são legais, mas naquele esquema “gente, temos N minutos aqui... próxima parada, N minutos”, ou seja, tempo cronometrado nas paradas. Não gosto muito disso, mas sim vale à pena!
quarto no Village Porto de Galinhas...

4.      Da Ilha de Noronha: Bom, esqueça o luxo, o glamour, etc. Não tente comparar a Ilha com Paraty, Búzios ou Angra (os lugares charmosos e da moda). Ainda bem que a Ilha é diferente. Rústico mesmo, selvagem. Mesmo que você esteja cheio da grana e fique nos hotéis com diárias a partir dos 1.500,00, seu dinheiro não te evitará de andar por ruas esburacadas onde barro ou poeira estarão sempre com você.
Fernando de Noronha...

5.      Dos Passeios na Ilha: Contratamos pela agência Costa Blue (https://pt-br.facebook.com/CostaBluePasseioseReceptivo). Os caras, além de excelentes profissionais e atenderem muito bem, têm passeios excelentes e se você perguntar ainda dão dicas de restaurantes bons e baratos (digo, não tão caros). Fizemos um Ilha Tour, onde você conhece as principais partes da ilha e o melhor, aprende a se localizar e se locomover por lá. E outro passeio que fizemos de barco, pela manhã, onde pudemos ver a Ilha por barco.
tartaruga que "capturei" mergulhando na Baía dos Porcos...

          Não deixe de conhecer a praia do Sancho, por onde você chega através de uma escadaria sofrível pelo meio das pedras – vale à pena, pelo visual fora e dentro d’água. Essa praia é visitada nos dois passeios aqui citados, sendo que, de barco, você pode mergulhar na praia sem ter que descer (e depois subir) a escadaria. Fácil ver tartarugas, arraias e diversos peixes. Tubarão só vi mesmo no mergulho na praia do sueste – bem pertinho de mim. Pôr-do-sol: vários lugares escandalosamente bonitos para isto: Conceição, Forte da Vila dos Remédios, Boldró, enfim, onde você for, certamente se deliciará em fotos e visuais arrebatadores.
6.      Do Mergulho na Ilha: leve nadadeiras e máscara, pois TODAS as praias de Noronha te oferecem mergulhos de snorkel com visuais fantásticos. Repito: TODAS as praias de lá são fantásticas!!! Nós havíamos contatado mergulho de cilindro (batismo) com uma agência que muita gente havia indicado: Águas claras. Mas a sinusite me atacou pesado, deixando-me simplesmente sem conseguir respirar nem sentir gosto das comidas... Com medo de que um mergulho de 10 metros ou mais piorasse minhas condições, cancelamos o mergulho e fomos até a praia do porto.
mergulho na praia do porto: Outro mundo...

            Não imagine uma praia com um porto tradicional como você conhece – ali são aguas transparentes também, como em todas da ilha. Lá conversei com um nativo gente finíssima, o BODÃO, instrutor habilitado de mergulho. Fizemos um trato: Um batismo num mergulho ali mesmo, 4 metros na maré seca (na cheia chega a 7), e se eu sentisse dor, não pagaria nada. Em vez dos 400 reais do batismo em alto mar, o preço do cara é 250. Bom, deu tudo certo, graças aos excelentes instrutores que ele nos disponibilizou (ele mesmo não mergulhou porque também estava com problemas de sinusite...). Os caras explicaram muito bem o que e como deveríamos fazer. Testamos primeiro no raso e fomos indo... até chegarmos a um naufrágio de um navio grego, onde chegamos a passar por dentro de parte do convés dele. Então??? Fantástico... mesmo!!!! Se você nunca mergulhou e está receoso, ou gripado como eu, bem, procure o BODÃO. Você não vai se arrepender...
nós e a equipe do Bodão (o de boné)... Muito bacana!!!

7.      Da Ilha em si – considerações finais: Ou você é um dos milhares de turistas que chegando lá gasta os tubos nas taxas de preservação e em passeios, mais ainda nos preços absurdos das coisas  e depois vai embora (envolto numa bolha sem saber o que acontece), ou você se informa. Não nos sites de dicas de viagem, mas conversando com os locais. Ande de ônibus por lá (3 reais e bem fácil de se locomover). Quando estiver na praia, pare e converse com os nativos sobre a taxa de preservação. Questione do porquê das ruas estarem todas esburacadas; pergunte sobre as máquinas escavadeiras enferrujando (doação do Governo Federal), paradas e sem uso.
Flávio, recepcionista da Pousada Gaúcha e responsável pelo que aprendi DE VERDADE sobre a Ilha

          Questione aos motoristas de taxi sobre o novo “dono-da-ilha”:  Eike Batista que ganhou a licitação para a construção dos decks nas praias do Sancho e Sueste (praias que cobram entrada para sua visitação), mas que tal dinheiro não é revertido para sua manutenção ou para a população local. O que o Governo está fazendo com a Ilha? Sugando seus recursos até a ultima gota. Gerando empregos aos seus protegidos para que eles nada façam para melhorar o local. Permitindo que alguém de fora arrende várias pousadas por lá para assim obter permissões e facilidades que não são dadas aos nativos em troca de dinheiro... Conheça mais sobre os problemas da Ilha, interesse-se, divulgue isso, mas acima de tudo, cumprimente os locais sempre que passar por eles. Lembre-se: eles estavam lá muito antes de você saber que Noronha existia. Então você entra na Ilha, invade seu local, lota suas praias, suja suas ruas e a dinheirama que deixa lá não ajuda a eles – esse dinheiro vai para algum investidor que vê a cor esmeralda da natureza de como uma simples pedra preciosa...
             Dois vídeos: eu mergulhando na praia do Porto 

       Áudio (o vídeo não está legal) com uma menina de uma escola cantando o Hino de Noronha: Sim, estivemos lá no dia do aniversário da Ilha (512 anos), mas quem ganhou o presente fomos nós. Parabéns Fernando de Noronha. Desejo que consigas sobreviver a todos os que te usurpam!


VIDA LONGA A FERNANDO DE NORONHA!!!